poesia viva
Amigos de Juvenal criam sociedade para preservação da Casa
Será instalada hoje a Sociedade dos Amigos da Casa de Juvenal Galeno (Sejuga) criada para ajudar a manter a residência do poeta cearense. O solar, no Centro de Fortaleza, dá abrigo, há quase um século, à cultura e à arte. O presidente de honra da entidade é Alberto Galeno, neto do poeta.
No meio da balbúrdia do Centro de Fortaleza, entre platibandas repletas de anúncios, vitrines espalhafatosas e o trânsito infernal, quase ninguém repara numa bela casa secular, conservada, apesar dos anos, com sua pintura clara, com detalhes em verde, e lá no alto uma sugestiva lira - instrumento associado há milênios com a arte da poesia. Uma placa metálica informa ao passante que ali foi a residência do poeta Juvenal Galeno. O atual dono da casa é o neto do poeta, o escritor Alberto Santiago Galeno. Hoje as portas duplas do solar vão estar abertas para a festa de instalação da Sociedade dos Amigos da Casa de Juvenal Galeno (Sajuga), que virá somar esforços, junto com a Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, para manter vivo este patrimônio comum.
A Casa de Juvenal Galeno, fundada em 27 de setembro de 1919 pelas filhas do poeta, Nenzinha e Henriqueta, é uma referência cultural da cidade. Nos seus salões e no quintal sombreado por mangueiras centenárias, poetas, escritores, cantadores, folcloristas foram recebidos e acolhidos, em noitadas literário-musicais que fizeram e continuam a fazer história. A casa, na rua General Sampaio, 1128, quase na esquina da praça José de Alencar, foi palco de saraus e festas memoráveis, principalmente nas décadas de 40 e 50. ''É importante, a criação da Sejuga. Quem mantém a casa sou eu, com dificuldade, sou um sujeito pobre. Se for pra desafogar os gastos com a manutenção da casa, é muito bom'', diz Alberto Galeno, esclarecendo que a casa que herdou de seu avô continua a ser um espaço cultural da cidade. ''Agora mesmo, no dia de São José, teve umas 300 pessoas aqui em casa, a Adísia Sá foi homenageada. Teve distribuição de milho verde, canjica, pamonha, estas comidas do inverno. Como sertanejo e devoto de São José, todo ano celebramos o dia dele com festa'', diz Alberto Galeno, que nasceu em Russas. ''Mas me criei pelo Cariri, meu pai era juiz de Direito e mudava muito de cidade''.
Alberto Galeno não conviveu com o avô poeta, morto aos 95 anos, em 1931. ''Cheguei em Fortaleza no ano de 1935, pra estudar. Em 40, vim morar aqui nesta casa, com minhas tias, Henriqueta e Nenzinha'', conta ele. A casa também se animou com as conversas picantes do poeta Quitino Cunha, verberou com a poesia de Jáder de Carvalho, com a prosa de Rachel de Queiroz, do contista Moreira Campos, do historiador Raimundo Girão, de Mozart Soriano e muitos outros.
Da lembrança de rapaz, Alberto Galeno resgata as muitas personalidades que frequentaram os saraus promovidos pelas tias, também escritoras. ''Patativa do Assaré foi homenageado aqui, o Câmara Cascudo fez conferência aqui, o Leonardo Mota, todo este pessoal. E o Demócrito Rocha era muito amigo de tia Henriqueta'', recorda. A casa também se animou com as conversas picantes do poeta Quitino Cunha, verberou com a poesia de Jáder de Carvalho, com a prosa de Rachel de Queiroz, do contista Moreira Campos, do historiador Raimundo Girão, de Mozart Soriano e muitos outros.
Parte do rico acervo bibliográfico foi doado por Mozart Soriano. Somado à biblioteca que pertenceu a Juvenal Galeno, são seis mil preciosos volumes. A residência, de dez cômodos, conta com dois auditórios. O principal, batizado de Juvenal Galeno, com capacidade para 120 pessoas, conta com palco, um piano de meia cauda e uma obra do pintor Otacílio Azevedo. O outro auditório, Nenzinha Galeno, fica no amplo quintal. É lá que acontecem os encontros de cantadores de viola, em noitadas ao luar.
Um poeta romântico
Juvenal Galeno (1836-1931), citado como ''o pioneiro do folclore no Nordeste'', extrapolou o lirismo de caráter pessoal para cunhar uma dicção popular, de sabor interiorano, em que retrata o Brasil dos pequenos e dos simples. A originalidade do poeta, em sua época, vai ainda para o reaproveitamento da tradição trovadoresca, através das trovas e quadras anônimas. Embora a paráfrase seja parte pequena da obra poética de Juvenal Galeno, esse é o timbre principal de sua criação, ''representar o povo brasileiro''.
Observador atento dos costumes do interior, do sertão às praias, Juvenal Galeno sempre quis ser um poeta popular, embora a afirmação de alguns historiadores de que tenha seguido orientação de Gonçalves Dias, quando de sua passagem pelo Ceará em 1859. O fato é que o primeiro livro do então jovem poeta, com 20 anos de idade, teria dado motivo a Gonçalves Dias para dizer-lhe que deveria seguir a poesia popular.
Prelúdios Poéticos é de 1856, livro típico do Romantismo, mas a indicação estética de que se valera Gonçalves Dias para orientar o jovem está lá, através de alguns poemas de sabor popular, como ''A Noite de São João'', ''A Canção do Jangadeiro'' ou ''Cantiga do Violeiro''. Poesia simples, coloquial, mas sem chegar à oralidade de um Catulo da Paixão Cearense ou de um Hermes Vieira,(1) a obra de Juvenal Galeno teria o seu ponto alto, já na maturidade do poeta, com o lançamento de Lendas e Canções Populares, de 1865.
A Sociedade Amigos da Casa de Juvenal Galeno fica na rua General Sampaio, 1128 - Centro. Hoje, às 19h30, festa de instalação da entidade.Informações pelo telefone 3231.1448
Com informações do Jornal de Poesia (http://www.jornaldepoesia.jor.br/)
(1)VIEIRA, Hermes Rodrigues Cardoso – n. 23-09-1911 - Fazenda Caiçara, município de Valença do Piauí (PI), atual município de Elesbão Veloso (PI), f. 17-07-2000 - Fortaleza (CE). Filho de José Francisco Ferreira da Silva e Maria Constância da Silva. Poeta popular, cronista e romancista. Foi policial militar e "guarda mata-mosquito", em cujo emprego, conheceu de perto a Amazônia e travou contato com os índios, com quem aprendeu a língua Tupi. É verbete do “Dicionário Biobibliográfico de Escritores Brasileiros Contemporâneos” (1998), de Adrião Neto. Bibliografia: "Poemas Nordeste" e "Piauí Sertão". Deixou inéditos: "Fatos, Lendas e Crendices do Nordeste", crônicas e poemas; "A Lagoa Encantada", romance; "Maria Amélia", romance; "Xingu", romance; "O Casal Fantasma Piauiense", contos, e um pequeno vocabulário etimológico da Língua Tupi. Foi incluído na coletânea “Caminheiros da Sensibilidade” (1966), organizada por J. Miguel de Matos, na “Antologia de Autores Elesbonenses” (1999), organizada por Maria Nilza, Celina Silva e Juraci Leite de Carvalho e no livro “A Poesia Piauiense no Século XX” (1995), de Assis Brasil. Comentário: Com prosódia popular no verso claro e ágil, Hermes Vieira, poeta de Teresina, na Terra Sagrada do Piauí, reúne evocações de figuras e paisagens regionais... Uma inteligência observadora e sagaz, manejo fiel do vocabulário certo, emoção ao recriar os temas que pertencem ao patrimônio regional... (Luís da Câmara Cascudo, in "Poemas Nordeste”).
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