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quinta-feira, 12 de março de 2009

Meio Norte - José Fortes - Cultura

As façanhas do pistoleiro Catanã

25/11/2008 - 10h:54

Embora o cognome seja o mesmo, não estou falando do sargento PM João Augusto da Silva Filho, o “Joãozinho Catanã”, acusado de comandar um grupo de extermínio no Ceará. Mas de Joaquim Leandro Marciel, ou Francisco de Assis Brasil, o Catanã, pistoleiro de dupla identidade, que aterrorizou os Estados da Paraíba, Ceará e Piauí na década de 50 e que ainda suas façanhas são lembradas por populares nas capitais desses estados.Catanã nasceu na Paraíba, em São João do Rio do Peixe, proximidades de Cajazeiras, região temida por Zé Cazuza, pistoleiro famoso, com centenas de mortes em todo o sertão daParaíba. Foi preso pelo sargento Irineu Rangel, delegado de Souza, a mando do governador João Suassuna, que decidira acabar com o banditismo. Com histórico de muitos bandidos, Catanã estreou no mundo do crime aos dezessete anos, para vingar a morte do pai, pequeno agricultor da região, que por disputa de terra terminou assassinado. Aos vinte anos, por uma boa oferta de um fazendeiro, ingressou no crime de encomenda, deixando ao longo dos janeiros um rastro de sangue, descrevendo uma vida pregressa, acobertada por mandantes “coronéis”, fazendeiros e políticos daquela região. Fugindo do cerco policial, refugiou-se em Valença, no Piauí, onde conseguiu mudar de identidade e viver alguns anos como pequeno agricultor. Em 1947, passou a morar em Crateús, no Estado do Ceará, onde segundo o senhor Jafé Gonçalves de Oliveira, 81 anos, morador antigo daquele município, foi pago pelos Belos, família de poder aquisitivo em Novo Oriente/CE, para matar o comerciante Raimundo Ximenes, que estava estabelecido em São Luiz do Maranhão, acusado de mandante da morte de João Belo, sendo que o crime praticado fora pelo próprio cunhado de Belo. Em São Luis, Catanã passou-se por vendedor de jóias para se aproximar do desafeto. Ao certificar-se de que se tratava de uma pessoa trabalhadora, resolveu não praticar o crime, recebendo de Ximenes pagamento para deixá-lo em paz e com o pedido de não executar o mandante, fato que revoltou o pistoleiro porque tinha essa intenção.As histórias que envolvem a vida criminosa de Catanã são vastas. A seqüência de crimes atribuídos, às vezes ceifando a vida do próprio mandante, quando percebia traição, o deixa em torno de um misto de Billy The Kid e Lampião.Na capital cearense, na Praça do Ferreira, conhecida como o coração de Fortaleza, também são lembradas as façanhas do Maior pistoleiro daquela década, que na opinião do senhor Raimundo Ferreira da Silva, aposentado, 82 anos, “era hábil no gatilho, nem todo policial tinha coragem de enfrentá-lo, só foi preso porque foi pego desprevenido”, conclui.
De Patos na Paraíba, o poeta popular Antônio Américo de Medeiros, forneceu-me estrofes do folheto de cordel Pistoleiros do Nordeste, edição de 1990, autor anônimo, onde o poeta faz uma retrospectiva do banditismo no Nordeste, transparecendo ao leitor que a prática da pistolagem é território sem domínio da força Pública: “O cangaço foi banido
no Nordeste brasileiro
mas o crime de aluguel
do perverso pistoleiro
é território sem lei
a polícia não dar frei
reina o gatilho certeiro.
Na Paraíba reinaram
em uma década passada
Zé Cazuza e Catanã
sem perderem a empreitada
no sertão alagoano
Chapéu de couro tirano
fez a sua diabada.
No Ceará foi Mainha
um temível pistoleiro
depois dele outros vieram
não acaba o justiceiro” (...)
Na Praça Rio Branco, em Teresina/PI, logradouro que serve de encontro de aposentados, artistas populares e de vendedores ambulantes, tive a oportunidade de ouvir várias histórias ao seu respeito, uma delas comentou o senhor Abílio Pereira de Sousa, servidor público aposentado, 80 anos, que um das peculiaridades de Catanã era ao ver a foto da vítima e expressar euforicamente: “já estou com raiva”. Na capital piauiense, o perito criminal Delfino Vital da C. Araújo, que conheceu o temível pistoleiro, fez uma retrospectiva de sua história, informando que a prisão do mesmo ocorreu no início da década de 60, em Fortaleza, e fora recambiado para a capital piauiense pelo tenente Veras, acusado de matar um motorista de um jipe, para roubar o veículo, nas proximidades da cidade de Demerval Lobão, município metropolitano da capital do Estado. O serviço de inteligência da Secretaria de Segurança, suspeitando que o mesmo tinha outros envolvimentos, abriu uma linha de investigação, oportunidade em que foi descoberta a vida pregressa daquele a que era argüido a própria personificação do Mal, ou imbatível pistoleiro.Uma entrevista sobre o bandido foi publicada, na época, em reportagem de Deoclécio Dantas, para o jornal Folha da Manhã, artigo que está contido em seu livro Dá Licença, Editora Halley, edição 2001. Nele, o jornalista esclarece que em tempos idos teve oportunidade de entrevistar, na penitenciária de Teresina, hoje abrigando o estádio Verdão, o temível pistoleiro, condenado a 30 anos de reclusão, mas incluído na soma de detentos de bom comportamento carcerário. Vivia cercado de livros com intuito de estudar o curso de direito e demonstrava arrependimento das vidas ceifadas, muitas delas pelo prazer de “ver a capemba do olho virar”. Segundo o jornalista, após a publicação da longa matéria, Catanã fora denunciado por um outro presidiário, de que aproveitava as saídas nos finais de semana para continuar a prática delituosa (matar gente), e que acabara de assassinar um policial na cidade de Macau, Rio Grande do Norte, fato comprovado na época pela investigação do capitão Astrogildo Sampaio, designado pela Secretaria de Segurança Pública. Catanã, que vinha sendo investigado pela Polícia piauiense, foi encontrado morto, numa casa no bairro Piçarra, vítima de envenenamento, como queima de arquivo ou desavença pela partilha do lucro, deixando incompletas páginas de um novo inquérito e observações pela crônica policial: o crime de pistolagem continuará um continente sem fronteiras, um território sem lei, envolto em uma seqüência de fatores ligados à questão sócio-econômica, freqüente em Estados como Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí, onde o silêncio é garantia de vida para a população menos favorecida.
Por Guaipuan Vieira, poeta, Membro da Associação Cearense de Imprensa e da Academia Municipalista de Letras do Estado do Ceará –AMLECE - cadeira nº 02

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